sábado, 28 de julho de 2007

Eu, diretor




Sábado à noite, 11 graus e metade do filme pra pensar.
Tive uma idéia de em um novo projeto. Não sei se pode ser chamado de filme, talvez seja apenas um estudo interessante, uma pesquisa. Mas pode se tornar um filme mesmo.
À partir de um mesmo roteiro de 5 minutos, 5 diretores diferentes irão realizar 5 filmes.
Estou muito curioso em entender mais este longo trajeto entre o roteiro e o filme. A percepção é a de que diferentes diretores podem dar interpretações e soluções completamente diferentes para o mesmo roteiro de modo que, ao final do processo poderemos ter 5 filmes completamente diferentes...

E curiosamente é exatamente isso que estou fazendo neste momento: re-interpretando meu próprio filme, à partir de meu próprio roteiro.
Na sexta o Rodrigo Toledo veio à Campinas. Fizemos a decupagem técnica da nossa diária mais complicada, a do banco 24 horas. Trabalhamos horas nisso. E no final do processo eu tinha a certeza de que eu acabaria mudando ainda muitas sequências. Eu ainda não estava convencido de que alguns planos ainda não estavam resolvidos...
Contamos os planos: 35. Se cada plano fosse feito com um mínimo de 2 tomadas, se tudo corresse bem, seriam 70 planos na noite. Carros de polícia, 15 figurantes, interpretações complicadas. Luzes pesadas e muitos movimentos de câmera. Chegaríamos na locação às 15h00. Arrumaríamos tudo para ao cair na noite, às 18h00 afinaríamos as luzes. Às 19h00 comeríamos e começaríamos as gravações de fato às 20h00. Até o amanhecer, teríamos 8, talvez 9 horas de trabalho.
Conclusão: impossível rodar nesta locação em uma diária.
Soluções possíveis: Ou filmamos em 2 diárias ou eu corto o roteiro.

Aumentar um dia de gravação é impossível (ainda que esta resposta irrite tremendamente o Rodrigo...). Cortar o roteiro pareceu a solução mais plausível.

Eu estava neste processo quando o Julio me anunciou: “corremos o risco de não conseguir de fato os carros de polícia. Aciona o plano B”.
Plano B? Que plano B? Eu tinha que ter o plano B?

Esta situação me abriu os olhos para duas coisas.
Primeiro: Que idéia está envolvida na produção de um filme de curta metragem independente no Brasil? Ou ainda: O que significa fazer um filme sem dinheiro no Brasil e ainda assim fazer um bom filme? Quem sabe dois filmes um dia?
Segundo: Que maneiras de interpretar a realidade o diretor pode criar de forma mais interessante?

Devemos fazer filmes ainda que não tenhamos dinheiro para isto. Devemos fazer filmes que possam ser feitos. Temos que produzir antes de tudo. Falar, mostrar, fazer, tornar possível. Temos que nos apropriar do cinema, torná-lo próximo e possível.A criatividade deve superar a barreira econômica.

É uma questão técnica totalmente vinculada ao tipo de filme que se quer fazer. Tempo, ritmo, dramaturgia, fotografia e movimentoss de câmera. É a verdadeira arte da coisa. Por isso o filme é do diretor... É o olhar do diretor sobre história que se que contar.
Por isso pensei no filme feito por vários diretores à partir de um mesmo roteiro. Porque acho que seriam feitos 5 filmes completamente diferentes.

Acho que eu estava equivocado em minha primeira decupagem técnica, ou melhor, acho que eu estava errado no caminho que eu estava dando para a conclusão do filme.
Foram dois problemas: eu estava complicando para a produção e minha criatividade estava sem estímulos. Eu estava buscando o obvio, enquanto eu deveria buscar o autêntico. Esse “autêntico”não significa necessariamente complicado. Uma solução simples pode ser autêntica se for honesta.
Muita movimentação de câmera, por exemplo, exige um conhecimento grande do plano. Exige muita experiência e sensibilidade.

Estou concebendo neste momento, à 6 dias do início das filmagens, algo que acredito ser mais bonito e interessante. Estou pensando em dar mais ritmo às tomadas, em trabalhar mais próximo da música. Quero buscar mais planos fechados e tentar contar a história aos pedaços.
Fundamentalmente irei resolver meu filme na montagem.

Amanhã tenho ensaio às 9h00.

O Brasil está jogando com os EUA e ganhando bonito.
Vamos que vamos que a coisa exige dedicação.

Inté

Hidalgo Romero

quinta-feira, 26 de julho de 2007

Uma explosão de sabor



Onze e meia.
Mandei uma última mensagem para os atores do curta com os horários dos ensaios da próxima semana.
Amanhã teremos reunião com as equipes de fotografia, produção e arte. O objetivo é definir os planos de todo o filme. Vamos nas locações e tudo o mais.
Temos um banco 24 horas sendo construído. Será no Super Bacana, restaurante perto da praça do côco. Ainda não resolvemos o problema dos carros de polícia e dos uniformes. Tem uma infinidade de objetos de cena para serem conseguidos. Figurinos estão sendo pensados pela Leila e pela Sandra. Vamos ter que pintar a cozinha da casinha azul- locação do filme. Tive uma reunião com a Brisa sobre os ensaios e passamos todo o roteiro. Tive uma conversa rápida com o Renato sobre a relação entre fotografia e direção. O Julio está na batalha da produção e botou o Zollner pra trabalhar. Descobri que a Sandra não sabe guiar absolutamente. Quase que o Ivens não pode gravar na sexta.

Meu dia parece ter tido 36 horas.

Esta relação entre roteiro e filme é muito louca. Me sinto espremendo, apertando, buscando ângulos e olhares diferentes dele a cada dia. Tem momentos que eu acho o roteiro perfeito. Outras vezes acho que me enganei com sua estrutura.
Estou naquele momento de dissecar a coisa, de ser auto crítico, de buscar os defeitos e exorcizá-los.
Parece que as soluções se movem mais vagarosamente do que as complicações.
Uma questão de agitação molecular.
Uma explosão de sabor.
Onze e quarenta e cinco.

quarta-feira, 25 de julho de 2007

Chegando de fininho

Depois de ler os textos da Sandra e do Alfredão, estou me sentindo a vontade para publicar neste blog! Adorei ver que o filme está ecoando na cabeça de outras pessoas. São pontos de vista tão distintos do meu, pois vejo o 38 como uma operação de guerra, cujo inimigo está mais bem armado e disposto a nos destruir! Calma, eu explico!

Eu sou o Julio, estou fazendo a produção do filme e tenho a difícil tarefa de realizar um curta muito complexo sem verba. Nunca esqueço uma frase célebre do Renato, grande padrinho e apoiador deste projeto: "a produção de um filme é uma catástrofe sob controle". Bom, a catástrofe tem data marcada: 3 de agosto. Resta saber se conseguiremos controlá-la.

Não aceitaria e não seria o maior entusiasta do projeto se o diretor não fosse meu irmão do peito. Não me arriscaria nesta empreitada se não acreditasse que o Hidalgo tem um talento para a coisa e, acima de tudo, se ele não tivesse este maravilhoso dom de construir relações e fazer amigos. Depois de fazer grandes e pequenos filmes, tenho certeza que isto é muito valioso para um diretor e tenho certeza que isto vai ajudá-lo a construir o seu caminho neste território hostil.

O 38 para mim é muito mais do que um filme sobre um cara que se revolta contra as margens que oprimem as suas águas revoltas. O 38 é o Hidalgo. Não a história em si, porque está em constante mutação, mas a forma como ele nos conta, a indignação misturada com malandragem, a fantasia esquecida que se confunde com a certeza que disse o não dito!

O 38 é um desafio para todos, como todo bom filme, como toda obra de arte. Não nasce pronta, não surge sem dor, sem angústia, sem incerteza. Vamos fazer um filme nas condições de produção mais adversas possíveis. No escuro, no frio e sem dinheiro. Mas estamos nos preparando.

Beijos

Julio

Êpa, acho que fui objetivo de menos. Queria ter comentado o papo da autoria, fica para a próxima.

Locações











Eu e Hidalgo visitamos algumas locações, neste domingo.
Seguem algumas imagens da casa do Anderson e Rita, onde serão filmadas algumas cenas.

Abraços

Leila Leme

Mais sobre autoria

Depois que publiquei neste blog o texto sobre autoria, minha amiga e comadre Coraci Ruiz me escreveu uma mensagem pessoal sobre a questão. Achei bastante pertinente para o debate e a consultei sobre publicar sua mensagem. Tudo OK. Então abaixo segue o texto dela.

Hidalgo Romero


Sobre a discussão da autoria coletiva, me identifico muito com o que vc disse. Pq na Cisco temos sempre essa idéia de direção coletiva e tal. Confesso que aprendi e gosto muito de compartilhar a direção com o Julio, na verdade hoje em dia é apenas assim que concebo o meu trabalho. Mas no "Histórias são histórias", por exemplo, me vejo muito apegada ao projeto e à idéia, e com muita dificuldade em pensar em dividir a direção com as outras pessoas da equipe que não ele. É uma vontade, essa de abrir espaço para outras visões se agregarem ao filme, mas ao mesmo tempo tenho uma relação forte com a autoria deste projeto, e me vejo com vontade de estar em posição de tomar as decisões finais.
Aí lembro de conversas com a Manô, pessoa fundamentalíssima no meu processo de aprender a ser e me identificar como documentarista. Quando filmávamos o Colhendo Sonhos, tentando fazer isso coletivamente, ela dizia que um filme precisa ter uma pessoa referência, aquela que pode dar a palavra final, que determine o olhar que predominará, que dará coerência a esse filme. E dizia que agregar idéias e conhecimentos dos profissionais envolvidos no documentário faz parte do trabalho de um bom diretor, e que não precisa chamar de coletivo para que todos dêem o melhor de si.
No seu caso, é muito claro que vc é o diretor, e não uma direção coletiva. Ao mesmo tempo não há dúvidas de que o cinema é por natureza uma linguagem construída coletivamente, pois são várias as técnicas e funções necessárias para que ele se concretize. Então dizer que o trabalho é coletivo é uma redundância, uma obviedade. Seria diferente do comum se vc tivesse aberto para a equipe a possibilidade de tomar tantas decisões quanto vc, e aberto mão da palavra final e enfim... acho que nem seria o caso.
Nesse quesito o Julio pensa diferente, ele acha que uma pessoa nunca irá se envolver tanto num projeto se for apenas "Diretor de Fotografia" quanto se for convidado para compartilhar a direção. Eu tenho minhas dúvidas, pois acho que cada um na sua especialidade, no momento em que é envolvido num projeto em que acredita, não precisa ser diretor para dar absolutamente o melhor de si...

Outra coisa, acho que o seu texto abre um espaço para uma outra discussão importante, que vc deveria incluir no blog: a questão da autoria mesmo, propriedade intelectual e todas essas coisas que a muda e a piolho e a galera do software livre estão sempre discutindo. Vc vai registrar seu filme no Creative Commons? Vai liberar para exibição, para reprodução e até para re-utilização de trechos de quem quiser se apropriar do conhecimento que vc está produzindo? Vai ser um filme livre??? Não sou especialista nesta discussão, mas vc bem que poderia entrar nela, já que tocou no assunto e que é algo tão importante hoje em dia!

Vamos continuar trocando idéias!

beijos

Coraci

BUTECO!!!

E' isso ai gente boa! (meu teclado nao tem acentuacao nem pontuacao)

Fiquei deveras contente com a convocacao ao banquete dos eleitos... O ruim e' pensar que a partir de agora nao posso mais ir as compras sem ser importunado pelo ardil da massa... Ossos do novo oficio!
Deixando o besteirol de lado, o fato e' que o ilustrissimo Hidalgo sabia bem das coisas quando me elencou pra interpretar o multivoco Pedrao... Afinal... Eu sou o Pedrao: -Pode pedir, malandro! -Um bolovo e um rabo de galo! -Opa... Pra ja! E o malandro: -Quanto e', Pedrao? -Dois real pra voce que e' meu chegado! O Pedrao e' o dono de bar que vende pela cara do cliente... Um copo de agua tem tres precos: pra madame e' um real, pro carteiro e' cinquenta centavos e pra mulecada do campinho e' na torneira! O bar do Pedrao e' o segundo lar dos mais chegados... La' a homarada encontra tudo o que precisa pra beber, pra comer e pra fugir da vida apertada, das cobrancas da dona patroa, da lingua da sogra malcriada, da filharada pidona e, com tanta cana, o esquecimento dos ais... Depois desse deleite, desse suspiro, eles lhe vem depois da ressaca, na madruga, hora de levantar a bunda da cama pra pegar no batente novamente!
A alma do Pedrao e' um pessimo negocio! Nunca ganhou dinheiro com a sua espelunca pois tem mais de duas caixas de papelao, debaixo do balcao, lotadas de cadernos de fiado! Isso o torna cada dia mais malaquias! Pra alguem passar a perna nesse grande figura precisa ser ligeiro na lorota... ele da' volta ate' nos pupilos do Edir Macedo! Nego humorado igual a ele: Dificil, viu! Acorda sorrindo e dorme gargalhando! O figura e' do bem! E respeita as coisas que nao se respeitam nos dias de hoje... Respeita o negro e o branco e o japoneis e a bixinha... Respeita o ladrao e o cana dura! Mas prefere o bandido, porque o gambe' e' bandido duuas vezes...

E' isso ai, gente!!! Vamo que vamo!

terça-feira, 24 de julho de 2007

Um comentário sobre o processo

Muito bem! Pelo visto serei uma das primeiras, depois do Hidalgo a postar no nosso bolg!

O segundo ensaio foi um pouco mais difícil, ou melhor, nada "genial", não fiz nenhuma grande descoberta. O que é bem normal, não é mesmo?
Mas me pus a pesquisar e buscar elementos, pois me sentia sem repertório pra fazer uma mulher chama Glória Mendes de Sá...

E achei vários textos legais sobre a Síndrome de Estocolmo. Talvez não seja novidade pra ninguém, mas a Síndrome de Estocolmo é um processo psicológico desenvolvido por algumas vítimas de sequestro (mantidas em cativeiro ou não). O termo foi dado por um psicólogo que analisou a relação dos reféns com os assaltantes um banco em Estocolmo em 1973. O assalto durou 6 dias e os reféns tinham mais medo da ação da polícia do que dos seu algozes e os defenderam depois no processo de acusação. Alguns mantiveram relações tão profundas que as famílias ficaram amigas. Li versões que 2 das vítimas se casaram com os 2 sequestradores, e versões que diziam que uma, das várias fãs, que escreviam pra eles na prisão, foi quem se casou.
Mas o mais interessante são os motivos levantados pelos psicólogos para que pessoas submetidas a atitudes violentas desenvolvam esse tipo de relação. O principal é a necessidade de desenvolver um mecanismo de sobrevivência, cooperando com o assaltante ou seqüestrador; no mesmo caminho o fato de ver o assaltante com carinho ameniza a violência da situação e “disfarça” eminência de sofrimentos físicos, ou os próprios sofrimentos físicos. Outro ponto importante é que ambos, refém e seqüestrador querem sair ilesos da situação e tacitamente se propõem a cooperar. E um ponto que acho interessante pra relação Glória X Anderson é que às vezes os reféns se identificam com os motivos do seqüestrador ou sentem-se culpados pelo que o motivou.
No caso da Glória, pensando na sua formação de esquerda, de intelectual, talvez ela possa ter uma identificação desse tipo, após algumas horas com o Anderson no banco. Mas acho importante nem deixá-la uma mártir, nem fazê-la uma pessoa apenas policamente correta, que no primeiro contato com o seu “objeto de pesquisa” se mostre uma grande vaca reacionária. Ao mesmo tempo, sempre deixar claro que os dois não jogam no mesmo time! Descobrir pequenos gestos e entonações que deixem claro as duas condições sociais, que deixem claro que por mais que “ele queira, ele não pode”, mas ela sim.
Como “tarefa de casa” o Jesser propôs que fizemos um relação de cada ação e propuséssemos 3 maneiras de executá-las. Além disso pensei em fazer 3 gestos decarinho, tensão, medo, ajuda, superioridade e piedade. Achei que esse último ser essa lente de aumento da relação entre a Glória e o Anderson.
Agora só testando!
Espero conseguir, em 4 minutos, colocar em prática tudo isso! Além de aprender a dirigir pra poder de fato quase bater o carro...

Pena que é curtinho...
Beijos
Pestana

segunda-feira, 23 de julho de 2007

Autoria, ego e outras conversas



Hoje à noitinha recebi uma ligação da Marema, um dos donos da produtora em que trabalho. Ela é, dentre outras coisas, alguém que tenho toda a liberdade e confiança para conversar sobre questões profissionais e pessoais. Afinal, ela me conhece a quase 30 anos.
Perguntei sobre o blog, se ela tinha lido e o que tinha achado.
O caso é que deixei de escrever sobre algo que é importante para ela. Sobre a autoria do roteiro do 38.
Bem, escrevi bastante sobre isso, mas não deixei suficientemente claro alguns pontos do roteiro que, certamente, deveriam ter sido comentados.
A idéia original do projeto é minha, assim como o desenvolvimento da narrativa e a versão final do roteiro. No entanto, uma vez que a produtora concordou em produzir o projeto, realizei conjuntamente ao Renato e a Marema inúmeras reuniões sobre o roteiro.
Discutimos desde a concepção da idéia até o formato dela, passando por diálogos e caracterizações dos personagens. E certamente parte do que o roteiro se transformou foi fruto destas conversas.
Na realidade conversei sobre isso com muita gente. Amigos, colaboradores e até gente que nunca conheci pessoalmente mas que tive contato em listas de discussões pela internet.
Mas de fato, uma vez que o roteiro se tornou um projeto da produtora, tivemos mais discussões sobre a história e sua narrativa do que eu tive com quaisquer outras pessoas.
Escrevi, nas primeiras publicações que fiz neste blog que o desfecho da história tinha sido uma sugestão do próprio Renato. Sugestão esta que me solucionou um grande problema na conclusão da trama e que, devo assumir sem maiores prejuizos, foi absolutamente fundamental para a versão que tenho hoje.
Porém nunca havia pensado sobre a questão da autoria do projeto como uma construção coletiva a ponto de ser creditado como tal. Entendi nestas ocasiões que esse trabalho de discutir e pensar o roteiro estava sendo feito como uma coisa natural, inerente a um processo criativo que envolvia um autor e uma produtora que bancasse as idéias deste autor.
Entendia que, de certa forma, em toda realização artística – e um roteiro entendo como tal – a troca de conhecimentos e experiências sobre os temas abordados na proposta eram necessários e importantes para seu desenvolvimento, mas não envolviam necessariamente autoria ou crédito.
Não sei se o comentário da Marema foi exatamente neste sentido, mas certamente me levou a reflexões desta natureza.
Acho até que no caso específico de minha história, o que a Marema quis dizer foi simplesmente que eu poderia ter sido mais gentil e até simpático dizendo que, para que o roteiro chegasse ao ponto de ser filmado, eu teria contado com a experiência dela e do Renato. Creio que seu eu tivesse sido mais cuidadoso e tivesse creditado a eles parte da versão final da história, tudo estaria resolvido.
De qualquer modo, acho que faz sentido para quem pretende desenvolver o “cinema de autor” pensar sobre a questão da propriedade intelectual de sua arte. Mais do que isso, acho que é importante pensar sobre como uma história é construida à partir da justaposição de diferentes experiências e que assumir uma história como “tua”é omitir o processo pela qual ela foi feita.
Um outro ponto de nossa conversa foi uma contradição encontrada pela Marema entre a forma que eu me referia aos outros profissionais envolvidos no filme e a maneira pela qual eu propunha ser o processo de construção dele.
Em outras palavras, a Marema identificou uma contradição entre o uso que eu fiz do pronome “meu” e de minhas propostas para o filme.
Se por um lado eu escrevi diversas vezes que “apenas a construção coletiva fazia sentido” e que eu preferia “o nosso ao meu”, por outras tantas vezes eu me referi ao diretor de arte do 38 como sendo “o meu diretor de arte”. “Meus atores”, “meu fotógrafo”, “meu diretor de produção” foram termos usados diversas vezes em meu discurso.
Realmente faz sentido. De fato se eu proponho um filme feito à partir da soma de experiências e cujo resultado seria um filme não apenas com a minha cara, eu não deveria ser tão possessivo no tratamento da equipe do filme, tratando-a pois, apenas como diretores do filme, atores do filme, etc.
Aqui acho que meu ago foi descoberto. Gostaria de dizer que fora inconsciente, mas temo que a esta altura não devo permitir tais excessos de inocência...
De fato creio ser natural uma certa posse sobre aquilo que fazemos parte tão intensamente. E no caso específico de uma criação artística, presumo que isso seja ainda mais forte, uma vez que nesta categoria de trabalhadores a humildade nunca foi uma qualidade marcante.
E aí a auto crítica deve manter vigília ainda mais ferrenha... Realmente não faz o menor sentido escrever “nosso”e no fundo querer dizer “meu”. Seria mais honesto portante assumir logo a autoria do filme e deixar as xurumelas para os que têm tempo para isso.
Porém de fato prezo pela construção coletiva, ainda que eu possa assumir que meu ago se infla muitas vezes. E o melhor que faço é assumir isso neste espaço e simplesmente evitar novos acontecimentos...
Acho que por hoje é só.

Boas noites.

Hidalgo Romero

sábado, 21 de julho de 2007

Segundo ensaio

A Brisa, a Érica e o Jesser esta semana se encontraram e construíram algumas dinâmicas de trabalho com os atores do 38.
Um dos pontos que eles irão trabalhar é o “estado de alerta”do ator, isto é, a capacidade de montar e desmontar o personagem rapidamente. Característica esta importantíssima no cinema, uma vez que entre um refletor e outro, que entre algum acerto de arte e outro, os atores passarão longo tempo esperando, até o momento de, em apenas poucos segundos, interpretarem a cena proposta.
Também conversamos esta manhã sobre possíveis detalhes que o roteiro fornece sobre o ator e sua ação. Ficou de lição de casa cada um dos atores levantar as indicações de seus personagens.
O Ivens disse ter visto o Ônibus 174. Ele ficou impressionado com o filme. Ele disse: “filme nada. Isso foi realidade”. Acho que este filme é um lado do Anderson. O lado mais cruel dele. O lado mais pobre e realista. Outro filme que eu gostaria que o Ivens assistisse é “Um dia de cão”, com o al Pacino. É uma história muito parecida com a minha. Mas o personagem é menos agressivo, menos violento, mais inseguro do que está fazendo. Neste filme o personagem tem o que perder, diferente do filme ônibus 174. Se bem que todo mundo tem algo a perder...
Os atores começaram hoje a montar as cenas. Criamos um balcão de bar e pusemos todos os personagens juntos, interagindo. Foi muito divertido. Do Pedrão, o dono do bar, pudemos notar 2 características muito interessantes, que podem facilmente serem trazidas para o personagem: Ele é muito organizado com as coisas do bar. Posiciona os objetos de maneira alinhada e equilibrada. Ele também tem uma firmeza no falar, como se mantivesse sempre sua autoridade sobre seus clientes. “Não esquenta com a conta hoje. Mas também não esquece dela”, ou “Fique a vontade. Mas nem tanto”.
Do Anderson com a Rita, ou do Ivens com a Melissa eu gostei muito de uma cena de afeto entre os dois. Ela o acaricia e ele se deixa acariciar, numa verdadeira relação de amor. Gostei muito dessa relação. Irei incorporar no roteiro algo deste tipo. Acho que o conflito do anderson, e sobretudo o impacto dele no sequestro vai se dar com mais intensidade criando este contraponto. Do afeto e da raiva.
Com relação ao policial, acho que uma característica muito forte do Guga – o humor – pode perfeitamente ser incorporada no trabalho. Propus a ele algumas pesquisas com policiais de verdade, talvez no Quarto DP de Campinas.
E por fim a Glória me parece já alguma coisa madura. Acho que o desenho geral dela está pronto. No entanto acho também que ela deve se transformar de alguma maneira. Acho que ela deve revelar algum traço de sua personalidade quando submetida ao estado de tensão do sequestro. Como se ela se revelasse algo que ela não era até então. Este personagem poderia facilmente cair no esteriótipo da luta de classes. Ela representaria então a classe dominadora. Teria a arrogância da burguesia intelectual de esquerda. Mas acho que se assim fosse, eu estaria conduzindo o personagem para um caminho errado, ou no mínimo bobo. A Glória é uma pessoa, com qualidade e defeitos. Ela não deve representar uma classe social. O trabalho de julgar deve ser feito pelo público e não pelo diretor. Não quero atribuir moralidade à ela.
Que difícil...

Fiquei muito satisfeito com o ensaio, com o trabalho de atores, com os atores e com a conversa no final do ensaio. Acho que tenho algumas coisas valiosas nas mãos. Preciso de bom humor, planejamento e inteligência pra coordenar tudo isso e chegar no filme que quero fazer.

Hoje fecho 2/3 das locações. Vou fazer uma reunião com a arte. A Coraci e o Julio também foram hoje fazer o making of do 38. Muitas coisas a serem feitas. Algumas ansiedades e pequenas complicações gastro intestinais, em decorrência de certo nervosismo, creio.
No mais, tudo em foco.

Hidalgo

quinta-feira, 19 de julho de 2007

C*O*L*E*T*I*V*O*S

Abraços coletivos a todos da equipe!!!


Hoje, finalmente tive tempo de ler com calma todo o blog e tô cada vez mais empolgado com o projeto e a fim de chegar logo por aí - amanhã confirmo minha passagem para o dia 27/07.
Gosto também da possibilidade de 'auto-reflexão-coletiva' sobre os mais variados aspectos do processo de criação através deste blog - mesmo que até agora só nas palavras do Hidalgo, escrevo mesmo que distante pra comungar com esta ação e pra animar a galera.

Agir e pensar, eis a questão!

Por aqui - estou em maceió, minha cidade de origem - estou conectado.

Desejo que tudo fique cada vez melhor!

Abraços e bom trabalho!

Rabelo.

A produção






Esta semana tive uma reunião bastante importante com o diretor de produção do 38, Julio Matos. Foi talvez a primeira reunião em que pudemos fazer uma avaliação do processo de produção do filme. Cada um de nós colocou todos os problemas e questões envolvidas no trabalho e, cada qual a sua maneira, tentou propor soluções.
Da minha parte me deparei com as seguintes questões: Adotei por meta uma frase do David Mamet, cineasta americano sobre a direção de cinema.
“A função do diretor é elaborar a sequência de planos à partir do roteiro. O trabalho no set de filmagem não é nada. No set de filmagem só se precisa ficar acordado, seguir o planejamento, ajustar os atores a serem simples e manter o senso de humor. O filme é dirigido ao se elaborar a sequência de planos. O trabalho no set de filmagem é simplesmente o de registrar o que foi escolhido para ser registrado. É o planejamento que faz o filme”.
A verdade seja dita: O Julio já havia me cantado esta bola antes. Quanto melhor estiver preparado e planejado o filme antes das filmagens, mais espaço para a criação o diretor vai ter ao rodar o filme.
Como disse, adotei este princípio totalmente. Talvez por isso eu esteja “perdendo tanto tempo” na definição dos planos. Um diálogo entre o protagonista e seu amigo e dono de bar, Pedrão, poderia ser facilmente registrado com planos e contra planos. Mas aí, penso eu, seria tão fácil quanto comum.
Einsenstein defende a idéia das imagens auto-infletidas. Não sei bem se entendi totalmente a questão, mas, mesmo correndo o risco de escrever coisas não totalmente corretas (e neste caso, se algum leitor resolver por bem me corrigir, faço votos...), vou expor minha leitura do que ele propõe. Ele acha que o filme se constrói `a partir dos cortes, e não dos planos. Isto é, ao querer contar uma determinada cena, ao contrário de muitos filmes do cinema americano (Griffith, por exemplo) que tem por hábito seguir o personagem e com isso contar o que o personagem faz, ele deve estruturar a narração dando a idéia de como a ação deve transcorrer com imagens que dão a idéia daquilo que se quer contar.
Um exemplo clássico: A intenção da cena é descrever uma situação de alerta. Segunda Einseinstein, e seu grande entusiasta David Mamet, normalmente coloca-se o personagem a olhar tenso para o horizonte, ou realizando uma sequência de ações que descrevem seu estado de tensão. Na idéia de imagens auto-infletidas, esquece-se temporariamente o personagem. Um gato sentado que subitamente levanta suas orelhas em estado de alerta. Depois, uma pessoa qualquer acende a luz da varanda de sua casa e sai na porta. O terceiro plano é o personagem de fato em alerta.
Ou ainda outro exemplo: Um encontro casual: Mostra-se um plano de pés caminhando rapidamente. Depois um homem sentado se levanta e olha bruscamente para o lado. O terceiro plano, naturalmente é o encontro.
Outro exemplo filmado: Alfred Hitchcock no Psicose, quando a moça no banho é morta. Ele mostra a faca, a mão dela agarrada no plástico do box e por fim o sangue descendo pelo ralo. Nós não vemos a faca propriamente entrando. Nem o assassino raivoso, nem a expressão de terror da assassinada.
Neste tipo de construção do filme, à partir dos cortes e não dos planos, deixa-se o trabalho de concluir o resultado da cena com o espectador. Ou melhor, ainda que o diretor acabe por mostrar obviamente o resultado de sua montagem auto-infletida, o espectador participa do filme na medida em que ele se antecipa à conclusão da cena e por si tenta chegar a uma conclusão sobre essa construção. É no meu entender uma maneira de considerar a inteligência de quem resolve gentilmente assistir ao seu filme. É respeitar o espectador e contar com ele para o sucesso da exibição.
Por isso tenho perdido tanto tempo em definir os planos de meu filme. E a coisa é ainda pior uma vez que tenho vivenviado um processo dinâmico na maneira como eu vejo meu filme: A cada locação, a cada trabalho com ator, a cada plano desenhado volto na visão do filme como um todo e faço o “ajuste fino”de todo o resto dos planos, das exigências, da produção de modo a adequar toda a peça a minha nova definição de planos.


Bem, a questão é que meu diretor de produção, Julio Matos acha que um curta metragem deve ser feito de outra maneira. Ele acha que tanto preciosismo e zelo complica. Não me entendam mal. Ele, em suas produções é muito rigoroso com a técnica e exigente com a qualidade da imagem. Não se trata absolutamente de fazer a coisa mal feita e sim de simplificar a produção. Uma concepção de se fazer cinema. Uma busca pela simplicidade, na contra mão da super produção.
Tratando-se de um curta metragem, sem dinheiro, a coisa deve ser pensada de modo a facilitar o trabalho. O número de planos devem ser estabelecidos contando com o número de dias estabelecidos no plano de filmagem. Os movimentos de câmera devem ser pensados levando em conta a natureza do trabalho.
A argumentação dele sustenta que um curta deve ser muito prazeroso e simples. Há quem diga que o curta metragem é a melhor escola para o longa.
Desta forma, a crítica que a produção me coloca é que tenho sido um tanto quanto lento em minhas definições e além disso, tenho levado mais problemas à produção do que esta produção pode resolver. Eu não estaria portanto me esforçando para adequar às características de produção possíveis.

Bem, tenho pensado muito nisso e de certa forma entendo e compartilho desta opinião. No entanto também vejo outras questões envolvidas.
Ao meu ver a produção é 50% movida por recursos materiais e 50% movida por criatividade. Isso siginifica que uma produção afinada permite que o diretor e a produção possam propor soluções criativas para problemas objetivos e para mudanças de concepções que o diretor pode ter no processo de construir um filme, inerentes à ele, sem necessariamente onerar custos extras. Esse tipo de afinação objetiva e prioriza, como não poderia ser diferente, única e exclusivamente o melhor resultado de um filme.
Se uma produção enfrenta problemas, ausências, carências, isso de alguma forma limita a criatividade do diretor e da fotografia e arte, por exemplo. Estes problemas por sua vez podem ser de naturezas distintas: falta de recursos, falta de motivação, falta de experiência, falta de coordenação, entrosamento e criatividade.
Finalmente eu acho que o limite entre simplicidade e bom resultado depende muito do quanto e do como a produção funciona. Por sua vez, também depende da sensatez, experiência e bom senso do diretor, que tem por obrigação seduzir e motivar sua equipe, equilibrando devaneios criativos com soluções possíveis à produção. Se possível tendendo ao limite do possível e cedendo diante do improvável.
Um outro agravante em uma produção se dá quando o diretor, por qualquer razão – incompreensão dos papéis em uma produção ou necessidade de suprir carências nela – acaba desenpenhando outras funções que não a de dirigir.
Se o diretor tem que ir buscar locações, preocupar-se com ofícios e requerimentos e outras questões típicas da realização de um filme, ele deixa de fazer com competência aquilo que ele deveria preocupar-se: a concepção do filme. A definição dos planos, da fotografia, dos movimentos de câmera, da arte. Por necessidade ou por equívoco, o diretor que se ocupa de questões outras que não sua própria função acaba por, quase que necessariamente, realizar de maneira mediana seu próprio trabalho.
É claro que em produções pobres ou com poucos recursos isso acaba sendo inevitável. Daí a dificuldade em se fazer bons filmes, uma vez que isso ocorre quase sempre no Brasil.

Em outras palavras, acabei decidindo que a crítica de minha produção é pertinente e razoável, uma vez que enfrentamos determinadas características humanas e materiais específicas, e que tenho que buscar soluções criativas e simples para os problemas que temos enfrentado. Está correta a leitura do Julio diante de nossas próprias características. Tentarei ao máximo solucionar com leveza, beleza e justeza minhas idéias como diretor à produção do filme. Porém deixo registradas minhas reflexões sobre essa importante relação entre a direção e a produção e sobretudo, para próximas realizações, sobre as próprias concepções de produção de um curta metragem.

Hidalgo Romero

sábado, 14 de julho de 2007

a direção...

9 pessoas caminham em um grande galpão. Formam uma espécie de círculo em torno de um homem. Ao fundo uma agradável música instrumental, cadenciada, dando tom a brincadeira. Este homem ao centro fala para os demais. “Uma tartaruga que algum antepassado seu comeu. Talvez a memória desta refeição continue em você. A memória de seu corpo, de sua musculatura”.
As pessoas estão concentradas em suas tarefas de sentir seus corpos, de pensar seus corpos. Um pensar que não está no plano da razão. Está no sentir do corpo.

Hoje demos início ao primeiro ensaio. Jesser é quem coordena o trabalho. Brisa e Érica são as diretoras do trabalho. Érica participa da atividade enquanto Brisa acompanha tomando notas do que está sendo feito, observando os atores, o trabalho. A querida Brisa está muito concentrada na sua tarefa. Dirigir meus atores.
Eu também estou observando. Na verdade escrevo estas palavras enquanto observo. Encantado com o que de certa forma minha energia gerou. Feliz em ver meu trabalho ganhando forma, se materializando.

Ontem fui dormir meia noite, absolutamente cansado. O trabalho de hoje teve início às 7h30. Coloquei meu relógio para despertar às 6h00. 5 e 15 acordei e não pude mais dormir. Preparei um café da manhã para as 10 pessoas hoje aqui presentes.Comprei 20 pães, frutas, fiz café. É verdade que Leila, minha companheira me ajudou... Felizmente todas as pessoas chegaram no horário. Acho que isso de certa forma reflete um interesse, um compromisso. E por outro lado pode querer dizer que estou conseguindo motivar as pessoas envolvidas. Um pouco mais tarde descobri que preparei muito mais comida do que as 10 pessoas seriam capazes de comer... Vai sobrar muita coisa.

A função de um diretor de cinema está se formando em minha cabeça. Tenho transitado entre produção, planejamento, fotografia, arte e trabalho com atores. Destas funções, as que eu mais tenho gostado de fazer é justamente o roteiro técnico, isto é, a definição dos planos, dos movimentos de câmera, da concepção estética e de linguagem do filme. A outra é o trabalho com os atores. O desafio é transmitir com firmeza, com clareza, com amor aquilo que eu vejo nos personagens.

O diretor tem que ser uma fonte inesgotável de energia. Ele tem por função, além das técnicas, ser por excelência o foco do filme, a fonte do filme. O diretor tem que ser fundamentalmente um cara legal, acessível, alguém em que se confie, que se goste. O diretor deve estar próximo da produção, da arte, da fotografia e, muito, dos atores.
Ele tem que ser o próprio filme, a verdade do filme. Ele tem que ser um pouco mãe e através de sua mão permitir que os outros também se sintam mães, se sintam parte, criem, inventem, recriem e interpretem.

Falei aos meus atores do que talvez seja minha característica como pessoa: Quero que meu filme seja nosso. Quero criar com vocês. Quero que vocês me falem dos personagens, me digam como e o que eles falam. De que maneira. Quero que vocês critiquem e proponham coisas para meu roteiro e que no final, da idéia original, reste apenas a idéia.
Acho que a coisa não faz sentido pra mim se a construção não for coletiva. Prefiro o “nosso” ao “meu”.

Eita.
Algumas fotos das atividades.

Hidalgo Romero





sexta-feira, 13 de julho de 2007

Sobre o elenco e o trabalho com atores

Serão 6 personagens e 2 ou 3 pequeninos papéis, fora alguns figurantes.
O ponto fundamentalmente para mim era: já que meu tema é violento, já que eu irei tratar da violência, então se eu mostrar essa violência na tela eu estarei reforçando algo que já é pesado demais por si só, e decididamente não precisa ser reforçado.
A opção por um tratamento violento na interpretação dos personagens, embora perfeitamente cabível dentro do meu contexto, seria tornar um filme excessivamente pesado, e creio que isso faria com que ele (o filme) deixasse de dialogar com muitas pessoas que já tão cansadas de tanta violência na vida real, no cotidiano.
Como disse o amigo Cláudio Minetto, “você quer mostrar ainda mais violência?”...
Pois é. O que eu quero não é falar de violência, nem mostrar algo violento, mas falar sobre a maneira com que a televisão aborda a violência. Eu quero construir uma crítica sobre a violência e não fazer dela uma questão.

Assim, desde o começo eu já tinha uma vaga idéia de que meus personagens não poderiam ser violentos, ou mesmo fazerem parte de alguma cena de violência. Eles teriam que interpretar o “antes”e o “depois” da violência. O que me interessa é o subjetivo, é o preliminar, é o simbólico desta história. No caso de um sequestro, por exemplo, não me interessa como ou de que maneira os personagens irão se atracar, se machucar, se violentar, mas sim que tipo de relação o Anderson, o sequestrador, e a Glória, a sequestrada, irão desenvolver. Que tipo de relação pode ser criada entre duas pessoas dentro de um banco 24 horas após 10 horas de convivência?
Que relação a esposa de um pretenso ladrão de ocasião, uma mulher de valores morais muito bem delimitados por uma orientação religiosa, pode criar com seu marido? Que relações o ladrão pode construir em uma negociação com a polícia brasileira, com um menino de 20 anos que está morrendo de medo da situação e tem permissão para atirar?

Enfim, no trato com os atores eu penso em abordar muito mais o que está por trás das ações do que elas propriamente ditas.

Neste sentido eu precisava de duas coisas: atores que se envolvessem com o projeto e atores que extraíssem de sí o personagem que será interpretado, através de uma pesquisa de campo, ou como construiu o LUME, grupo de teatro de Barão Geraldo, uma pesquisa orientada pela Mímese Corpórea.

Assim eu precisava de um ou dois diretores de atores que tivessem envolvimento com a arte interpretativa e que topassem essa empreitada. A Brisa, amiga e atriz, concordou em tentar esse trabalho. Ela por sua vez chamou uma amiga para ajudá-la, a Érica. E fiquei absolutamnete lisonjeado e feliz quando o Jesser, um veterano do LUME, se interessou pelo projeto e concordou em fazer uma espécie de orientação de atores, com a Mímese Corpórea.
Assim propus um trabalho que fosse construído em 3 oficinas de 3 horas, semanais, que antecederiam obrigatoriamente os ensaios para o filme. Os ensaios por sua vez serão feitos em 5 dias, que antecederão as filmagens, nos dias 3,4,5 e 6 de agosto.
Minha proposta é que cada ator terá a liberdade de construir totalmente seus personagens através de uma pesquisa e inclusive propor cenas, diálogos e situações. Estaremos trabalhando com um roteiro aberto, isto é, sem roteiro e sem falas pré-definidas. Quero construir a cena na cabeça dos atores e a partir daí eles irão extrair deles mesmos a fala, o jeito de falar, as palavras e todo o resto. Inclusive no caso do personagem principal, que na minha cabeça quase não fala, ele terá que construir um diálogo fundamentalmente corpóreo.

Estaremos trabalhando também com alguns atores que não são atores profissionalmente. Já escutei que alguns cineastas preferem trabalhar com não atores. Isso se justificaria pelo fato de que, primeiro, a interpretação no teatro tem outra lógica da interpretação no cinema, e segundo porque o ator de teatro tem uma série de “vícios”do teatro que simplesmente não funcionam no cinema.
Sobre a primeira prerrogativa, acho que essa natureza distinta das técnicas interpretativas se dá principalmente nos tempos e sequencias da relação ator/personagem. No teatro, uma vez aquecidos, uma vez concentrados os atores iniciam suas ações e sustentam o personagem por um determinado tempo contínuo. No cinema a coisa funciona aos tranquinhos, aos pedaços e entre cada cena distinta, entre cada plano muitas vezes a ação é interrompida pela necessidade de iluminação ou mesmo de observações do diretor, e o ator esfria e desmonta seu personagem.
Sobre a segunda afirmação, creio que estes tais “vícios” que supostamente o ator de teatro tem dizem respeito a necessidade de expressões faciais e gestos que terão que ser visto por gente que está na décima, décima sexta fileira e portanto não vê com clareza a própria interpretação do ator.
No cinema a coisa funciona com mais sutileza, com menos exagero. Tudo é visto pelo olho da câmera e pelo filtro do diretor...

Mas realizando os testes com meus atores percebi um ponto que depõe contra esta teoria de que não atores podem se dar melhor no cinema: Não atores não têm o que estou chamando de “repertório” gestual e técnico que o ator desenvolveu ao longo de anos.
Por exemplo: como representar uma reação de medo? Existem uma infinidade de maneiras de se fazer isso. No entanto, qualquer pessoa tem alguns pequenos truques na manga, e que estão em um inconsciente coletivo humano e que portanto acabam, no caso das artes interpretativas, sendo as primeiras e mais obvias reações. O ator desenvolveu ao longo dos anos um repertório maior de reações ao medo, que fogem do obvio e espontâneo.
Em outras palavras, embora o ator de teatro no cinema PODE trazer alguns vícios, ele também tem mais repertório do que o não ator. E o não ator por sua vez, é muito mais dependente da direção do que o ator.

Bem, deixando de xurumelas, realizei testes com quase 25 atores, buscando em suas vozes, expressões e gestos aquilo que eu via em meus personagens. Depois de muitas discussões e algumas dúvidas cheguei, chegamos, eu Brisa,Érica e Jesser aos 7 atores para o papel.
As suas fotos estgarão sendo postandas logo abaixo. Espero que ninguém se incomode... Se isso acontecer, eu tiro. Hehe.

Inté

Hidalgo Romero


Ivens interpreta o Anderson.



Melissa interpreta a Rita.



Sandra interpreta a Glória.



Alfredo interpreta o Pedrão.



Guga interpreta o policial de 20 anos.



Fabio interpreta o policial experiente.



Rabelo interpreta o repórter.

quinta-feira, 12 de julho de 2007

LOCAÇÕES

Aqui são algumas das locações do filme. A única que ainda não fechamos totalmente é a casa do casal Anderson e Rita. Provavelmente será a casinha azul...




A casa de Anderson e Rita


A equipe de filmagem: Rodrigo Toledo, o fotógrafo, Vitor Akkas, o diretor de arte, Leila Leme, a assistente de arte, Kid, assistente de direção, Hidalgo Romero, o diretor, Alê Machado, o produtor de campo e o Julio Matos, diretor de produção que está atrás da lente.





As verdadeiras donas da casa.

da idéia ao roteiro, da produção à direção - parte 2



Depois do que eu julgara ter sido a última versão do roteiro, passei a considerar seriamente a possibilidade de filmá-lo.
O caso é que desde dezembro de 2006 eu trabalhava na produtora de cinema de Barão Geraldo Kinostudio – Cinema Digital do escritor e documentarista Renato Tapajós. O trabalho que eu desenvolvia na produtora eram dois: realizar o roteiro do romance “Em câmera lenta”, do própria Renato e trabalhar como um “desenvolvedor de projetos”. Isso significava que eu iria inscrever os projetos da produtora em editais e concursos para tentar captar recurss financeiros para filmá-los.
Na ocasião a produtora havia recém adquirido alguns novos equipamentos e em uma das nossas conversas o Renato manifestou o desejo de filmar um curta metragem. Esse curta teriam duas funções fundamentais:
1 – Testar os equipamentos da produtora em diversas situações de luz e captação;
2 – Iniciar uma nova etapa na produtora, que até então desenvolvia projetos de documentários e institucionais mas não de ficção. Esta nova etapa era justamente de iniciar a produção de ficções, que até onde eu pude entender era um namoro antigo do próprio Renato.

Foi do Julio Matos, que também trabalha na produtora como diretor de documentários, de aproveitar meu projeto de curta no projeto da produtora.
Foi dele também o trabalho de convencimento para unir estas duas propostas.

Para minha grande satisfação a idéia foi acatada. À partir daí teve início um longo período de acertos e acordos, principalmente no que dizia respeito ao roteiro. A sinopse do filme até aquele momento poderia ser entendida como “é melhor roubar do que se fuder”, ou ainda “se você estiver sem trabalho, sem dinheiro e sem possibilidades de ter os dois em um curto espaço de tempo, considere que roubar não é algo tão detestável assim”.
O caso foi que o Renato Tapajós e a outra dona da produtora, Marema Valadão definitivamente não entendiam a questão da mesma forma que eu.
Ambos tendo vindo de uma tradição profundamente socialista, de movimentos sociais, eles defendiam a idéia de que grandes transformações só poderiam ser feitas à partir das massas e que não havia absolutamente nada de interessante em meu argumentos, uma vez que o que eu propunha era abordar uma ação de certa forma individual no trato com a “distribuição de renda”, devendo, pois, ser alterado meu roteiro.
O que eu tentava colocar em minha história eram duas coisas distintas: a primeira dizia respeito a maneira cruel e irresponsável que os meios de comunicação, rpincipalmente a tv colocam a questão do consumismo, vendendo por preços absurdos a idéia de que qualquer um pode adquirir qualquer coisa. A segunda dizia respeito não tanto a uma ação política e social por parte do povo, mas de uma reação de indivíduos do povo que, não sendo burros ou estúpidos, reagiriam aquele estímulo, refletiriam suas con dições e no limíte poderiam chegar a soluções violentas para o terrível impasse que sondava constgantemente suas vidas. Como combater sua própria miséria. Neste sentido, eu argumentava, a violência, o roubo, o sequestro e até em certa medida o crime organizado poderiam se entendido como uma manifestação política, ou no mínimo uma reação natural e legítima à desigualdade social.
No entanto eu julguei na ocasião resolver a equação interesses da produtora X interesse do autor, chegando a um acordo da maneira mais satisfatória possível. Assim resolvi em defesa de meu filme modificar o roteiro.
Foi do próprio Renato a idéia de incorporar à história não só a televisão em si, mas o fenômeno de mídia, ou em entras palavras, a maneira com que os meios de comunicação abordavam a violência. Como a tv, de maneira a defender fundamentalmente interesses privados de grandes coorporações, trata de maneira irresponsável fenômenos sociais e transformam em última instância violência em espetáculo, espetáculo em medo e medo em dinheiro.
Basta ver por exemplo o BOOM de condomínios fechados em Barão Geraldo. Pessoas que procuram esconderijo atrás de muros...

Continuo a questão em uma terceira parte.

Voltando a produção, tive um pequeno problema felizmente quase resolvido com a locação do Anderson e da Rita, o casal que protagoniza meu filme. O Rodrigo Toledo, meu fotógrafo não gostou da locação. Ele achou basicamente que a casa não represnetava, em termos de arte, o que poderia ser de fato a casa do meu personagem. Além disso também achou que a locação não tinha profundidade de campo suficiente para uma boa imagem. “tudo fica muito apertado. O que nosso olhos vêm é muito diferente daquilo que a câmera vê”. Assim passei a considerar a busca de outra locação.
Acho que uma das coisas boas deste filme está sendo a antecedência com que o estamos produzindo. Isso nos permite esse tipo de trabalho. Procurar com calma locações, criar e pensar em cima da arte e da fotografia.
Assim fui eu ontem mais uma vez procurar outras locações para o casal Anderson e Rita. Achei duas casinhas, no mesmo bairro (o bairro da locação é importante, pois a proximidade com uma terceira locação, o bar do Pedrão – outro personagem – iria facilitar o trabalho de produção. Ou eu encontrava uma casa para os protagonistas no próprio bairro de São Marcos ou eu encontrava um outro Bar do Pedrão próximo da nova casa do Anderson). Gostei das duas casinhas. Abaixo segue também suas fotos.

O elenco está fechado e neste sábado teremos o primeiro ensaio. Fotos dos atores também serão incluídas neste blog para apreciação.

Até breve.

Hidalgo Romero

segunda-feira, 9 de julho de 2007

da idéia ao roteiro, da produção à direção - parte 1




Inauguro este blog afinal. Sou Hidalgo Romero, brasileiro, 30 anos e este será, se tudo der certo, meu primeiro filme de ficção. Assino sua direção.
Aqui acho que vale uma pequena sinopse do filme, assim como um breve relato de sua concepção e produção.

O roteiro é relativamente antigo. uns 3 anos. Nasceu de um comercial de tv que assisti. Um fulano havia sido preso por tentar assaltar um carro, um Audi. A dondoca que guiava reagiu e o cara acabou por esfaquear brutalmente a dona. Seu azar foi que ela não era uma simples dondoca. Ela era a esposa de um grande empresário, milionário, acho que dono de alguma grande construtora do país.
Um escândalo, por fim. Tudo estava ameaçado. A moral, os bons costumes. Tudo.
Depois do estardalhaço das tvs, foram entrevistar o cara. "Mas porque, pobre homem? O que te levou a um ato tão primitivo, envergonhando nosso Brasil varonil? ", perguntaram ao sujeito. Ele respondeu assim na lata, na frente das câmeras e tudo: "Sou servente de pedreiro. Eis que chego em casa depois de um dia de trabalho e ligo a tv. Estava lá. AUDI, SÓ NÃO TEM QUEM NÃO QUER. E eu quis."
Esse depoimento foi mais ou menos assim mesmo.
Beleza. Nenhuma novidade. A televisão lava a alma mesmo. Mas fiquei com vontade de falar sobre isso. De como recebemos dia após dia tanta punhetação, tanta mentira, tanta informação desencontrada. E daí para a indústria do medo, de como se ganha muito dinheiro espalhando o pânico, o terror, os condomínios fechados, a especulação imobiliária. De como não existe um só controle sobre o que é exibido nas tvs. Ou ainda, de como um sistema de comunicação, baseado em poucos formadores de opinião, que não conta com a pluralidade de pontos de vista, a cada dia se torna mais explícito em seu propósito maior: ganhar dinheiro.

O roteiro mudou acho que umas 40 vezes até chegar na versão final, que em breve publicarei.

Na parte dois conto sobre a produção, sobre a produtora envolvida no filme, sobre o projeto maior em que o filme está inserido e tudo o mais.

Neste exato momento acabo de fechar o elenco. 6 atores. Tenho basicamente toda a equipe de filmagem e fechamos as locações.
Amanhã o diretor de fotografia, Rodrigo Toledo, está vindo de São Paulo, às 10 da manhã, para a decupagem técnica. Vamos para as locações fazer uma espécie de storyboard com fotografias.

Tenho quase todo o filme decupado em minha cabeça. Amanhã irei fechar tudo com o Rodrigo e com meu cenógrafo, Vítor Akkas.
O diretor de produção, Julio Matos, compadre e amigo deu a funça federal no filme. Ele foi fundamental para a viabilização do projeto. Na verdade, mais do que isso: foi ele quem me fez acreditar no filme.

... Ele deve estar publicando algo em breve.

Abaixo as primeiras fotos das locações: A casa de Anderson e Rita, o shopping center iguatemi, as ruas do São Marcos, o bar do Pedrão e a esquina do centro de Barão Geraldo onde vai rolar o sequestro...

valeu.

Hidalgo Romero